Candido Martins Advogados

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De quem é a última palavra? Contradição na edição da nova súmula do Carf sobre responsabilidade solidária

15.10.2024

Súmula, palavra decorrente do latim summa, significa síntese. Nada mais é do que um resumo que consolida o entendimento e redireciona os julgamentos de um Tribunal a respeito de determinado tema. Por meio da edição de súmula, decorrente de reiteradas decisões proferidas no mesmo sentido, os tribunais uniformizam o julgamento do tema ao qual ela se refere, trazendo agilidade ao contencioso e previsibilidade às partes – que, em tese, já sabem qual será o resultado de sua demanda naquele tribunal.
Dentre as 16 novas súmulas editadas recentemente pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), uma que nos chamou atenção foi a Súmula nº 210, que presume a responsabilidade solidária de empresas do mesmo grupo perante obrigações previdenciárias sem a necessidade de que o Fisco demonstre o interesse comum entre elas na constituição destas obrigações.
Isso significa que, no julgamento de recursos em processos administrativos federais que tratam de dívidas previdenciárias, sendo apenas constatada formação de grupo econômico, as empresas integrantes responderão em conjunto pelos débitos, mesmo que não haja interesse comum, podendo o Fisco cobrar o débito integral isoladamente de qualquer uma delas.
Todavia, esse entendimento vem totalmente em sentido oposto ao da jurisprudência firmada pelos Tribunais Superiores.
Por mais que o Carf seja a última instância administrativa, os contribuintes ainda podem levar seus casos para julgamento na esfera judicial – onde a tese sobre o tema da solidariedade de grupos econômicos mostra-se diversa.
De acordo com as decisões a respeito do tema do Superior Tribunal de Justiça (STJ) – corte responsável pela uniformização da jurisprudência sobre a interpretação da legislação federal –, em caso de execução de cobrança de débitos tributários, o mero fato de haver a formação de grupo econômico não leva automaticamente à responsabilidade solidária prevista no artigo 124 do Código Tributário Nacional (CTN).
O fundamento está no CTN, que prevê a solidariedade nas obrigações tributárias apenas nas hipóteses previstas em lei ou no caso de haver interesse comum no fato gerador da obrigação. Nesse sentido, não é apenas porque duas ou mais empresas compõem um grupo econômico, que estaria configurado um mesmo interesse.
O termo “interesse comum” utilizado pelo CTN não está relacionado ao proveito econômico do fato gerador, mas sim de uma atuação conjunta – o que não é o caso de débitos previdenciários, uma vez que eles são vinculados a atuação de empresas distintas, mesmo que do mesmo grupo. O “interesse comum” para reconhecimento desta solidariedade deve decorrer de uma situação jurídica em que duas ou mais empresas agem conjuntamente na prática do fato gerador e dele se aproveitando, como é o caso de duas pessoas possuírem um mesmo imóvel e serem responsáveis solidárias pelo pagamento do IPTU.
Ainda que se trate de um caso diferente, cabe mencionar também o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento de recurso repetitivo que deu origem ao Tema nº 13, no sentido de que débitos previdenciários não podem ser redirecionados ao sócio da empresa, justamente porque a responsabilização de um terceiro depende do preenchimento de requisitos legais.
Diante desse contrassenso de posicionamentos, restam dúvidas sobre a aplicabilidade da recente Súmula Carf nº 210.
Ao que tudo indica, a palavra final a respeito do tema seguirá sendo dos Tribunais Superiores, que ainda exigem a constatação de prova do interesse comum para que haja a responsabilização solidária de um grupo econômico.
Se o objetivo das súmulas é facilitar o julgamento e reduzir o contencioso, é contraditório o fato de o Carf ter editado a Súmula nº 210 em desacordo com a jurisprudência dos Tribunais Superiores e, de certa forma, até com o CTN. Agora, a busca por um resultado favorável nestes casos ganhou mais um obstáculo, que provavelmente deverá ser levada ao judiciário. E onde fica a economia processual?

Por Júlia Dias, advogada no Candido Martins Advogados.

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