A exigência do diferencial de alíquotas (DIFAL) do ICMS nas operações interestaduais com destino a consumidor final sempre foi objeto de dúvidas e discussões.
O assunto é complexo, os Convênios publicados pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ) não ajudam e os Estados, muito menos.
Tentaremos aqui explicar o a problemática do DIFAL de forma simples e, para isso, é importante olhar o tema em perspectiva.
Regra geral, ICMS é devido ao Estado de origem da mercadoria.
Dada a grande difusão da modalidade de comercialização via e-commerce, e considerando que os grandes centros de distribuições têm uma presença maior em Estados do Sudeste do País, muito se discutia sobre a concentração da arrecadação do ICMS em poucos Estados.
O resultado dessas discussões foi a edição da Emenda Constitucional nº 87/2015, estabelecendo uma repartição da arrecadação do ICMS entre os Estados de origem e de destino das mercadorias.
Após à edição da Emenda Constitucional, o CONFAZ publicou o Convênio nº 93/2015, tratando das regras gerais aplicáveis ao DIFAL (tais como apuração da base de cálculo, responsáveis tributários pelo recolhimento do imposto, obrigações acessórias, entre outros). E os Estados editaram suas leis internas, operacionalizando a exigência do DIFAL.
Em fevereiro de 2021, no julgamento do RE nº 1.287.019/DF, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a Emenda Constitucional nº 87/2015 impôs nova relação jurídica tributária entre sujeito ativo que cobra o imposto (Estados) e sujeito passivo que paga o imposto (contribuintes), motivo pelo qual, seguindo o sistema tributário detalhadamente delineado na Constituição Federal, o DIFAL não pode ser exigido antes da edição de Lei Complementar dispondo sobre as regras gerais para a sua incidência.
Com esse entendimento, o STF julgou inconstitucional o Convênio CONFAZ nº 93/2015 por invasão de matéria reservada à Lei Complementar. Houve, ainda, modulação dos efeitos da decisão para 1º de janeiro de 2022, aplicando-se a decisão aos casos a partir desta data.
Os Estados, por meio de seus representantes no Congresso Nacional, deveriam aprovar uma Lei Complementar para regulamentar a cobrança do DIFAL. E foi o que de fato aconteceu: em 4 de janeiro de 2022, foi publicada a Lei Complementar nº 190/2022.
E é a partir daí que nasceu a atual discussão a respeito do DIFAL.
A Lei Complementar nº 190/2022 faz referência à norma constitucional da anterioridade de 90 dias para a sua produção de efeitos.
Ocorre que, por dispor sobre nova regra de incidência tributária, a Constituição Federal exige a anterioridade de exercício – o que significa dizer que o DIFAL só pode ser cobrado pelos Estados a partir de 1º de janeiro de 2023.
Acompanhando o trâmite legislativo do Projeto de Lei nº 32/2021, que resultou na edição da Lei Complementar nº 190/2022, identifica-se que houve um atraso na sanção presidencial, pois a Lei Complementar foi aprovada pelo Senado Federal ainda em 2021, no dia 20 de dezembro de 2021.
Os Estados, naturalmente, entendem que o DIFAL poderia ser cobrado imediatamente (tendo em vista que buscaram a publicação de suas normas internas regulamentando o DIFAL antes mesmo da publicação da Lei Complementar nº 190/2022). Mas a afronta à norma constitucional é evidente.
Do ponto de vista prático, os contribuintes podem ter suas mercadorias confiscadas pelos fiscais Estaduais caso o DIFAL não tenha sido recolhido. E os contribuintes, mais uma vez, são obrigados a propor medidas judiciais para ter seus direitos constitucionais preservados. Alguma novidade?