Na TV, no fintwit, nas reuniões e conversas com amigos não se fala em outra coisa além da reforma tributária, o que não é nenhuma surpresa considerando o impacto democrático que a mudança trará nos bolsos Brasil afora.
No entanto, outra reforma menos famosa vem caminhando silenciosamente rumo à aprovação definitiva no Congresso Nacional, com um impacto para a governança corporativa tão grande quanto a sua prima mais famosa.
Trata-se da MP do Ambiente de Negócios (MP nº 1.040/21), aprovada pela Câmara dos Deputados no último dia 23 de junho e que traz uma série de mudanças com o objetivo de aumentar a atratividade do mercado brasileiro para investidores estrangeiros e nacionais.
Dentre as alterações propostas, uma das mais importantes é a introdução do voto plural no direito brasileiro.
O tema vem ganhando tração nos últimos tempos em razão do número crescente de companhias brasileiras que resolveram abrir o capital no exterior. Segundo o raciocínio por trás dessa proposta, a ausência de previsão legal no Brasil para o voto plural faria com que o país fosse preterido na onda recente de IPOs.
Esse movimento, porém, vem sendo impulsionado mais pela liquidez dos mercados do que pela questão societária em si. De qualquer forma, foi com base nessa narrativa que o voto plural entrou na rota das reformas promovidas pelo Governo Federal.
Apesar do propósito nobre, a forma como o voto plural está previsto no texto legal aprovado recentemente pela Câmara parece longe de cumprir com seu objetivo.
Na verdade, a própria legislação brasileira já previa algumas alternativas que, de uma maneira ou outra, supriam a necessidade de uma classe de ações especiais com votos multiplicados (as ações super preferenciais são um excelente exemplo nesse sentido, inclusive sendo recentemente adotadas no IPO da Track & Field).
Por conta disso, a expectativa era de que o voto plural, quando implementado, pudesse trazer maior clareza em relação às regras de governança e uma maior segurança a controladores e investidores. Não parece ser esse o caso com o texto da MP.
A proposta atual traz diversas regras que, na prática, podem se voltar contra o instituto.
Por exemplo, o voto plural terá um prazo de vigência inicial de sete anos, prorrogável mediante aprovação dos acionistas das demais classes. Em que situações um empreendedor adotaria o voto plural quando, já na largada, ele terá um prazo certo em que perderá o controle da sua companhia? Nesse caso, a emissão de ações preferenciais sem direito a voto parece mais atrativa.
Outra regra que pode desincentivar a pluralidade de votos é a proibição de incorporação, incorporação de ações e fusão envolvendo uma incorporada sem adoção de voto plural por outra que o adote. Sabendo desta restrição de antemão, as companhias adotarão uma regra que as limitará de crescer via aquisições?
Claro que essas limitações foram pensadas como um mecanismo de controle do voto plural, com o louvável objetivo de coibir eventual abuso do instituto. Porém, o resultado pode ser justamente sua inviabilidade, fracassando com o objetivo enunciado de tornar o ambiente de negócios brasileiro mais convidativo.O risco que se corre hoje é que tenhamos uma nova regra com aplicabilidade limitada… para inglês ver. Um voto plural pero no mucho. Aguardemos os próximos episódios no Congresso Nacional.